🔍︎ | [PT] EN
🔍︎ | Contacto | [PT] EN
Reportagens de Concertos
10.000 Anos Depois Entre Vénus e Marte
2014-04-12 | Alfândega do Porto

13116 Dias Depois!

Que é como quem diz, já lá vão 35, quase 36 anos desde que foi lançado o álbum 10.000 Anos Depois Entre Vénus e Marte, magnífico trabalho de rock progressivo que José Cid lançou em 1978. E foi uma sala da Alfândega do Porto praticamente cheia que ansiosamente aguardou este concerto que poucos julgariam possível de vir a acontecer até há algum tempo atrás, e que só o crescente (e bem merecido) reconhecimento que esta obra tem vindo a merecer permitiu, tornando viável a muito bem vinda iniciativa da Malpevent de realizar estes 2 concertos dedicados a este álbum.

José Cid
2014-04-12 22:30
O concerto arrancou com Vida (Sons do Quotidiano), EP cujo lançamento anteceu 10.000 Anos... e desde logo deixaram bem claro que o concerto fora preparado de forma cuidado e os temas tão ensaiados quanto possível. Tudo foi tocado como na gravação original, sem desleixo, cortes ou simplificações. Com todo o respeito merecido pela obra - e pelo público, que rapidamente passou da ansiosa curiosidade para os aplausos de apreciação. Continuou-se a retroceder no tempo com Onde, Quando, Como, Porquê, Cantamos Pessoas Vivas, dos seus tempos de Quarteto 1111, com o guitarrista Chico Martins a evidenciar-se nos longos solos, assim como Sameul nas diversas mudanças rítmicas proporcionadas pelo tema. Tempo então para uma viagem ao futuro e a temas novos, a ser lançados naquele que Cid anunciou como o seu próximo e provavelmente último álbum de rock sinfónico Vozes do Além. Alguns dos temas, baseados em poemas de Natália Correia (Creio) ou Sophia de Mello Breyner (Um dia), revelaram-se como composições mais pausadas, mas também houve momentos de rock a abrir, com grandes riffs de guitarra e teclado, como aquele que provavelmente será o tema-título Vozes do Além.

E eis que Cid indica que "chegou o momento de apertar os cintos e partir para a viagem", aproveitando ainda para agradecer publicamente à família Trindade por ter arriscado e lançado aqui no Porto o álbum, em 1978, pela sua editora Orfeu. O teclado começou a tocar o início do tema de abertura O Último Dia na Terra e rapidamente as palmas se fizeram ouvir em toda a sala a acompanhar, com alguns gritos de incentivo à mistura, reveladores do grau de intensidade que este concerto veio a gerar em muitos dos presentes. Seguiram-se naturalmente os restantes temas do álbum, respeitando a sequência apresentada na gravação, ou não fosse este álbum conceptual. Chico Martins continuou a mostrar-se como um dos elementos mais em destaque, muito em particular nos riffs e solos mais a abrir, em que a sua guitarra soava mais solta e poderosa. Nos solos mais melancólicos a guitarra soou um pouco frágil e temerosa, algo que se compreende - afinal, estes temas estavam a ser tocados ao vivo pelas primeiras vezes nestes 2 concertos, não estando ainda enraizados e criados hábitos que permitissem um grande à-vontade. Desta feita, conseguiu-se obter com O Caos um excelente efeito graças às suas nuances rítmicas e maior agressividade. E, se a voz de José Cid por vezes não foi tão certeira como esperado - principalmente na primeira metade do concerto - o mesmo não se pode dizer relativamente à sua surpreendente prestação nos teclados, cumprindo em todas as intervenções mais complexas em que surgiu a solar ou a acompanhar as melodias da guitarra em uníssono, como fez em Mellotron, O Planeta Fantástico, tema em que também sobressaiu Pepe, no baixo. Seguiu-se aquele que terá sido o momento mais marcante da noite, com o tema-título 10.000 Anos Depois Entre Vénus e Marte a provocar arrepios quando a voz de Carmo Godinho se juntou aos instrumentos para dar um nível maior de intensidade e dramatismo. Pouco depois, José Cid coloca todo o público a cantar, com o apoio da letra projectada no fundo do palco, repetindo por três vezes enquanto filmava o momento. Carmo Godinho voltou a encantar ao juntar-se à melodia dos instrumentos também no tema seguinte A Partir do Zero, e com Cid a brilhar novamente no teclado. De referir também a participação de Zé Perdigão que acompanhou Carmo nas 2as vozes, e a relevante participação do maestro Augusto Vintém que discretamente mantinha a coesão e densidade dos temas escondido atrás dos seus teclados. O concerto encaminhava-se para o seu término com o último tema, Memos. Chegado ao fim, o público reagiu com longos momentos de aplauso de pé, com muita gente a acercar-se pelos corredores laterais, alguns com a rara edição em vinil orgulhosamente em mãos, para o terem assinado. José Cid dirigiu-se novamente ao público para agradecer e também para reforçar novamente a gratidão para com a família Trindade pelo risco assumido pela edição deste trabalho, acabando com a repetição de 2 dos temas da noite - [song}O Caos e 10.000 Anos Depois Entre Vénus e Marte. O público continuou a avançar pelos corredores laterais e a acercar-se do palco, enquanto todos os restantes se levantaram das cadeiras para assistir de pé, abanando a cabeça, cantando ou gesticulando ao som da música. Largos eram os sorrisos de cumplicidade entre os presentes, indicação clara de que valeu bem a pena aguardar estes 13116 dias que mais pareceram 10.000 anos para assistir ao vivo a este concerto. Fosse outra a cultura musical deste país e talvez outros trabalhos de rock sinfónico se tivessem seguido, e a história fosse outra... ainda assim, poder assistir a este concerto após estes anos todos foi já um excelente motivo de festejo e gáudio para os presentes, graças à forma séria como José Cid e companhia se entregaram a esta demanda. E a noite acabou com uma repetição daquele que havia sido o momento mais alto, com todos o público a cantar novamente em conjunto...


Podes ver 10.000 anos depois

No ecrã do radar, Entre Vénus e Marte

Um planeta vazio À espera que o descubram

Onde recomeçar Outra civilização